No Brasil, o dia 20 de novembro é mais do que uma data lembrada em escolas e espaços públicos: tornou-se um marco de reflexão profunda sobre as cicatrizes deixadas pela escravidão e pelo racismo estrutural no país. É um convite a revisitar a história, reconhecer desigualdades e valorizar a resistência do povo negro.
Em Manaus, o feriado da Consciência Negra passou a integrar oficialmente as agendas públicas estaduais e municipais, marcando a data com manifestações culturais, atividades gratuitas e ações de valorização da identidade afro-brasileira. Além da celebração, o dia reforça o reconhecimento da contribuição histórica da população negra para o Brasil, da literatura à política, dos movimentos sociais à formação cultural da Amazônia.
O feriado, instituído pela Lei Federal nº 14.759/2023, marca oficialmente a data no calendário nacional e homenageia Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares e símbolo da resistência negra no século XVII. A medida ampliou a visibilidade das discussões sobre racismo, políticas públicas e cultura afro-brasileira, além de impulsionar programações municipais em escolas, centros culturais e espaços comunitários.
A origem da data e seu significado
O 20 de novembro marca a morte de Zumbi dos Palmares, assassinado em 1695. A data surgiu como contraponto ao 13 de maio, dia da assinatura da Lei Áurea, considerada por movimentos negros como uma celebração limitada, por não reconhecer as lutas de resistência do povo negro ao longo dos séculos.
A aprovação do feriado nacional, em 2023, foi celebrada como vitória política e simbólica pelos movimentos negros.
No campo literário, nomes como Machado de Assis, primeiro presidente da academia Arasileira de Letras, filho de uma mulher negra, nascido no Morro do Livramento, Rio de Janeiro, de uma família pobre, mal estudou em escolas públicas e nunca frequentou universidade. É considerado um dos maiores escritores da língua portuguesa, destacam a presença e o impacto da intelectualidade negra na história do Brasil. Para o considerado crítico literário norte-americano Harold Bloom, Machado de Assis é o maior escritor negro de todos os tempos. Outros nomes igualmente fundamentais incluem Carolina Maria de Jesus, Conceição Evaristo, Lima Barreto, Solano Trindade, entre tantos outros.
Presença negra no Amazonas
No Amazonas, o legado da população negra está presente em personalidades que marcaram a história política e cultural do Estado. Entre elas, destaca-se Eduardo Gonçalves Ribeiro, militar, engenheiro e governador negro do Amazonas no final do século XIX.
Eduardo Ribeiro foi responsável por boa parte da modernização da cidade durante o Ciclo da Borracha, coordenando obras que moldaram a Manaus contemporânea, como o Teatro Amazonas, o Palácio da Justiça, o Mercado Municipal Adolpho Lisboa, a Imprensa Oficial e a urbanização da atual Avenida Eduardo Ribeiro. Sua gestão simboliza o protagonismo negro em uma época marcada por forte exclusão racial.
Além dele, artistas, coletivos culturais e pesquisadores negros seguem fortalecendo a identidade afro-amazonense.
Segundo o Censo 2022 do IBGE, 9,9% da população da Amazônia Legal se declara preta e 65,2% parda, revelando a dimensão afrodescendente da região. Um levantamento da CONAQ com o ISA identificou 632 territórios quilombolas na Amazônia Legal, crescimento de 280% em relação ao mapeamento anterior. No Amazonas, são 2.705 quilombolas em sete municípios.
O líder espiritual Pai Alberto Jorge, reforça a dimensão mais profunda do Dia da Consciência Negra: a luta cotidiana por dignidade, memória e reparação histórica.
“O dia 20 de novembro, aqui no Brasil, se coloca como uma conquista por direitos que ainda hoje são negados. A população negra continua sendo a maioria nas prisões, nos números de subemprego, submoradia, moradores de rua, prostituição masculina e feminina, abandono infantil. Também continua entre os maiores índices de insegurança alimentar e nutricional. É uma data para se pensar que a escravidão não acabou. Porque os efeitos nocivos de 400 anos de escravidão oficial, ainda permanecem até hoje”, destacou o líder religioso.
Racismo estrutural no Brasil
Apesar dos avanços dos últimos 60 anos, como cotas raciais, ampliação de direitos e criação do Ministério da Igualdade Racial, o presidente da Fundação Palmares, João Jorge Santos Rodrigues, afirma que o cenário ainda está longe do ideal. Pretos e pardos formam 55,5% da população brasileira, segundo o Censo 2022, mas ainda enfrentam desigualdades profundas.
Rodrigues compara o racismo brasileiro a outros modelos pelo mundo e o define como:
“um racismo sistêmico, um crime continuado, sofisticado e permanente.”
A violência policial e a desigualdade no mercado de trabalho ainda são marcantes. Embora representem a maioria da população, pretos e pardos ocupam apenas 8% dos cargos de liderança no país. Além disso: 52,2% não sabem como denunciar casos de racismo. Apenas 47,5% conhecem legislações antidiscriminatórias.
Segundo o professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e pesquisador de africanidades na Amazônia, gênero, sexualidade e festas populares, Adan Renê Pereira da Silva o letramento racial é uma das saídas para que o racismo seja vencido na sociedade.
“O primeiro ponto em que a gente pode enfrentar esse racismo estrutural, é reconhecer que ele existe. E um segundo ponto é a gente procurar essas informações. O racismo é estrutural e tem um significado tão amplo que até via inconsciente a gente acabar reproduzindo esses estereótipos e violências ligadas a esse racismo.
Então, entender que ele está na estrutura significa que é muito difícil alguém, por mais esforçado que seja, ser completamente antirracista. Então, acredito que a gente também precisa procurar esse conhecimento, precisa procurar esse letramento racial. E para isso a gente precisa ler esses autores negros, negras, pessoas indígenas que estão escrevendo sobre o tema, e entender como que a gente pode de fato se aliar nessa luta, fazer parte dessa luta”, afirmou o pesquisador.
A educação decolonial que valoriza as contribuições dos povos africanos e afro-brasileiros, suas histórias e civilizações é considerada ferramenta essencial no combate ao racismo e na construção de uma sociedade mais justa e equitativa.
PROGRAMAÇÃO EM MANAUS
FEIJOADA QUILOMBO SÃO BENEDITO
- Local: Quilombo de São Benedito, Praça 14
- Entrada: Gratuita
- Resumo: A tradicional feijoada com programação cultural e shows musicais a partir das 17h.
CIRCUITO REGGAE AMAZONAS – 7ª EDIÇÃO
- Local: Praça Rio Negro – Orla do São Raimundo
- Horário: A partir das 15h
- Entrada: Gratuita
- Resumo: Shows e atrações culturais em celebração ao Dia da Consciência Negra.
EXPOSIÇÃO “ILHÁTICA AMAZÔNICA”
- Local: Galeria do Largo
- Horário: 15h às 20h
- Entrada: Gratuita
- Resumo: Imersão poética e crítica no território amazônico; em cartaz até fevereiro de 2026.
FESTIVAL DE CULTURA AFRO-INDÍGENA
- Local: Prosamim do Centro (Sob a ponte da Av. Leonardo Malcher)
- Horário: A partir das 16h
- Entrada: Gratuita
ABERTURA DA EXPOSIÇÃO “ELERI-IPIN”
- Local: Casa Cultural Ayédùn – Bar da Encruzilhada
- Horário: A partir das 18h
- Entrada: Gratuita
- Resumo: Exposição dedicada ao Culto Tradicional Yorubá.
A CELEBRATION OF BLACK VOICE
- Local: Icbeu – Av. Joaquim Nabuco, 1286
- Horário: 17h30
- Entrada: Gratuita
A MÚSICA AFRO-BRASILEIRA – AMAZONAS BAND (REGÊNCIA: ÊNIO PRIETO)
- Local: Teatro da Instalação
- Horário: 19h
- Entrada: Gratuita
Em Manaus, o Dia da Consciência Negra se fortalece como momento de celebração, reflexão e reconhecimento. Entre atividades culturais, ações comunitárias e debates sobre a história afro-amazonense, a cidade reafirma a importância de olhar para o passado para compreender o presente e construir um futuro mais justo e igualitário.
Com informações: G1, Revista Digital Claudia e Agência Brasil*
Por Ismael Oliveira – Redação Jovem Pan News Manaus






