Segurança pública no RJ volta ao foco com operação recorde de mortes em favelas

Com 64 óbitos em megaoperação nos complexos do Alemão e da Penha, governo fluminense enfrenta pressão por explicações e críticas de ativistas das comunidades

O Estado do Rio de Janeiro vive mais um momento crítico de segurança pública após a deflagração da Operação Contenção nesta terça-feira (28), considerada a maior em 15 anos no estado e marcada por ao menos 64 mortes nos complexos da Complexo do Alemão e da Complexo da Penha.

A ação mobilizou cerca de 2,5 mil policiais civis e militares e resultou em dezenas de presos, além de milhares de pessoas impactadas pela interrupção de transportes, escolas e unidades de saúde.

Movimentos de favelas e organizações da sociedade civil denunciam que esse tipo de intervenção fortalece uma lógica de confronto em territórios predominantemente negros e empobrecidos. Em nota, 27 entidades afirmaram que “segurança pública não se faz com sangue” e classificaram a operação como evidência de falhas sistêmicas na política de segurança estadual.

O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) exigem do governo estadual o envio de um relatório detalhado sobre a operação, incluindo custo, planejamento e conformidade com os parâmetros da ADPF 635, que estabelecem diretrizes para intervenções em favelas.

Enquanto isso, a rotina da cidade foi profundamente alterada: vias como a Linha Amarela e a Avenida Brasil ficaram fechadas, coletivos foram usados como barricadas por criminosos e universidades suspenderam atividades.

Especialistas em segurança pública apontam que, embora o foco seja o enfrentamento à facção Comando Vermelho, o método adotado agrava a sensação de insegurança nas comunidades.

Morte como política pública

Moradores relatam cenas de guerra. “Os corpos negros algemados. Os corpos jogados pelo chão da favela… A polícia não age da mesma forma na Zona Sul”, afirma o ativista e diretor da Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial, Fransérgio Goulart. Essa percepção alimenta a tese de que a ação tem impacto distritalizado, atingindo desproporcionalmente comunidades vulneráveis.

A perspectiva de especialistas é de que a operação pode marcar um novo patamar de controle estatal-militar sobre as favelas — mas também de responsabilização social e política. A cobrança pública cresce, enquanto famílias buscam respostas e justiça.

Antes dessa ação, a de 2021, no Jacarezinho, havia deixado 27 pessoas mortas.

As entidades afirmam que “segurança pública não se faz com sangue” e que o resultado da operação desta terça-feira revela “o fracasso e a violência estrutural das políticas de segurança no estado”.

De acordo com o documento, as favelas do Rio têm sido, ao longo das últimas décadas, palco de uma política de segurança baseada no uso da força e na letalidade, sustentada por discursos de “guerra” e “resistência à criminalidade”. As organizações denunciam que as ações têm caráter seletivo, afetando principalmente moradores negros e de baixa renda.

O grupo também aponta que essas operações não demonstram redução do poder de facções criminosas, mas sim provocam medo, instabilidade e rupturas no cotidiano de milhares de famílias. “A morte não pode ser tratada como política pública”, reforçam.

“O que se vê hoje é o esgotamento de qualquer compromisso com os direitos humanos e a legalidade. O Estado tem substituído a segurança pública voltada à proteção de direitos por intervenções militares de larga escala. Sob o discurso da ‘guerra às drogas’, instala-se um cenário de insegurança permanente que atinge a população negra e pobre das favelas. Não há justificativa para uma política estatal que continue sendo conduzida com base no derramamento de sangue”, diz trecho da nota.

O documento é assinado por: Anistia Internacional Brasil, Justiça Global, Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), Conectas Direitos Humanos, Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL), Instituto Papo Reto do Complexo do Alemão, Redes da Maré, Instituto de Estudos da Religião (ISER), Observatório de Favelas, Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular (NAJUP), Movimento Unidos dos Camelôs, Grupo Tortura Nunca Mais – RJ, Fórum Popular de Segurança Pública do Rio de Janeiro, CIDADES – Núcleo de Pesquisa Urbana da UERJ, Instituto de Defensores de Direitos Humanos (DDH), Iniciativa Direito Memória e Justiça Racial, Frente Estadual pelo Desencarceramento – RJ, Instituto Terra Trabalho e Cidadania (ITTC), Associação Amparar, Gabinete Assessoria Jurídica Organizações Populares (GAJOP), Instituto Sou da Paz, Rede Justiça Criminal, Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE RJ), Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (RENAP RJ), Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência, Casa Fluminense e Plataforma Justa.

Fonte e fotos: com informações da Agência Brasil sobre a Operação Contenção e a crise de segurança no Rio.

Por Tatiana Sobreira, da redação da Jovem Pan News Manaus.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *