Botos-vermelhos ganham “check-up” científico no coração da Amazônia após tragédia ambiental

Equipe do Instituto Mamirauá capturou e monitorou 17 animais no Lago Amanã para entender saúde, deslocamento e efeitos das mudanças climáticas

Um grupo de 17 botos-vermelhos (Inia geoffrensis) recebeu um verdadeiro “check-up” no meio da floresta amazônica. A captura científica, realizada entre os dias 20 de setembro e 2 de outubro, no Lago Amanã, dentro da Reserva Amanã (AM), é parte de um esforço inédito para compreender a ecologia e a saúde dos botos da Amazônia Central, especialmente após a tragédia ambiental de 2023, quando centenas de animais morreram em consequência da seca extrema.

A ação foi conduzida pelo Grupo de Pesquisa em Mamíferos Aquáticos Amazônicos do Instituto Mamirauá, com apoio de especialistas da Associação R3 Animal, National Marine Mammal Foundation, Universidad de Las Palmas de Gran Canaria e Wildlife Conservation Trust. Moradores ribeirinhos e pescadores locais também participaram da operação — com o conhecimento tradicional que há séculos orienta o manejo desses animais icônicos da Amazônia.

“Capturar esses animais é de extrema importância para compreendermos o panorama de saúde dessa população de botos de forma abrangente, definindo parâmetros de saúde como uma preparação para o que pode acontecer em anos futuros”, explicou a pesquisadora Miriam Marmontel, líder do grupo no Instituto Mamirauá.

Monitoramento contínuo e dados vitais por satélite

Durante a captura, os pesquisadores coletaram amostras de sangue e secreções, permitindo análises hematológicas completas e a detecção de agentes infecciosos, contaminantes e biotoxinas. Além disso, 12 transmissores satelitais foram instalados nos animais, registrando informações sobre localização, profundidade e temperatura da água.

Esses dados permitem acompanhar o deslocamento dos botos em tempo real, revelando como eles se adaptam a variações ambientais e possíveis ameaças em seu habitat natural — informações estratégicas para ações de conservação preventiva.

“Neste ano, felizmente, a seca não tem sido tão intensa como nos dois últimos anos, portanto não esperamos que haja uma mortalidade significativa. Contudo, devido aos impactos das mudanças climáticas, tudo indica que eventos extremos se tornarão mais comuns, e precisamos estar preparados”, alertou Marmontel.

Um sinal de alerta vindo das águas

O monitoramento contínuo é resultado direto do impacto observado em 2023, quando uma seca severa provocou a morte em massa de mais de 200 botos-vermelhos e tucuxis (Sotalia fluviatilis) no Amazonas, especialmente na região do Lago Tefé. Pesquisadores estimam que a tragédia reduziu em até 15% a população local — um golpe duro para uma espécie de ciclo reprodutivo lento e já pressionada por colisões com embarcações, redes de pesca e poluição.

Com a nova captura científica, o Instituto Mamirauá busca não apenas entender o impacto das secas passadas, mas também avaliar a resiliência da espécie e criar mecanismos de resposta rápida para evitar novas perdas em eventos climáticos futuros.

A ciência que escuta o rio

A operação também simboliza uma rara convergência entre ciência e saber tradicional. Pescadores das comunidades do entorno ajudaram a localizar e conduzir os animais com segurança durante as coletas, reafirmando que a conservação dos botos depende tanto dos laboratórios quanto das margens dos rios.

Os próximos meses serão decisivos: as equipes vão acompanhar os deslocamentos registrados via satélite, correlacionando os dados com o regime das águas e os índices de temperatura. A expectativa é que o estudo traga subsídios para políticas públicas de manejo e ações emergenciais em futuras estiagens.

Como lembra Miriam Marmontel, os botos são mais que um símbolo da Amazônia — são termômetros vivos da saúde dos rios.

“Quando o boto adoece, o rio está doente. Compreender o que acontece com eles é também compreender o que está acontecendo conosco.”

 

 

Com Informações da Assessoria

Por João Paulo Oliveira,  da Redação Jovem Pan News Manaus

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