Exclusivo: cientistas revelam segredos dos geoglifos e reescrevem a história da Amazônia

Em entrevista ao programa Radar 98, pesquisadores do Instituto Geoglifos da Amazônia detalham descobertas que desafiam o mito da floresta intocada e mostram a sofisticação das antigas civilizações amazônicas

Os mistérios que dormem sob o solo amazônico estão sendo desvendados. Em entrevista ao programa Radar 98, apresentado por Álvaro Campelo, o diretor-executivo Hudson dos Santos Ferreira, a mestre em Ciências Ambientais e indígena Judith dos Santos Ferreira e o geógrafo e presidente do Instituto Geoglifos da Amazônia, Dr. Alceu Ranzi, ofereceram um mergulho inédito nas descobertas sobre os geoglifos — monumentais figuras geométricas escavadas no chão da floresta que estão transformando a compreensão sobre o passado da região.

A entrevista acontece logo após a inauguração da exposição “Geoglifos da Amazônia – Desvelando o Passado Profundo”, em parceria com o Museu da Amazônia (MUSA), em Manaus. A mostra apresenta ao público as evidências de que a Amazônia foi densamente habitada por sociedades complexas e tecnologicamente avançadas muito antes da chegada dos colonizadores europeus.

O diretor executivo do Instituto, Hudson dos Santos Ferreira, explicou o que torna essas estruturas tão impressionantes — e tão difíceis de serem percebidas.

“Os geoglifos são grandes estruturas escavadas no solo, que formam valetas e muretas criando desenhos geométricos monumentais — círculos perfeitos, retângulos, quadrados e linhas paralelas. O que mais chama atenção é a monumentalidade. Alguns chegam a três quilômetros de extensão, como o que temos em Boca do Acre. Do chão, você só vê o desnível do terreno, mas, a partir de 30 ou 40 metros de altura, os desenhos ganham forma e dimensão.”

Hudson destacou que os geoglifos revelam uma engenharia e uma organização social muito mais avançadas do que se imaginava.

“Eles foram feitos por povos ancestrais que viveram há milhares de anos e que, naquela época, já tinham uma sofisticação e uma tecnologia suficientes para erguer estruturas que resistem até hoje. É um impacto muito interessante perceber que existia aqui uma civilização complexa, com domínio sobre o ambiente e visão de longo prazo.”

A bióloga Judith dos Santos Ferreira, mestre em Ciências Ambientais e Sustentabilidade pela UFAM, reforçou que as descobertas científicas apenas confirmam o que já era sabido por muitas comunidades tradicionais.

“Esses estudos mostram o que, para mim, como mulher indígena, não é novidade: nós sempre tivemos a capacidade de construir, de criar e de transformar o ambiente. O que surpreende é a escala, a monumentalidade dessas estruturas. O que faltava era a ciência olhar para isso com o mesmo respeito com que olha para as pirâmides ou para as Linhas de Nazca.”

As escavações e estudos de campo ao longo do rio Purus vêm revelando uma Amazônia viva e planejada, com manejo florestal, ocupações permanentes e sistemas agrícolas organizados. Judith destaca que essa nova leitura da história rompe com o estereótipo de uma floresta virgem e desabitada.

“Esses povos moldaram a paisagem e deixaram marcas que estão sendo redescobertas agora. É a nossa herança. A Amazônia não é apenas floresta — é também civilização.”

O presidente do Instituto, Dr. Alceu Ranzi, referência internacional no estudo dos geoglifos, relembrou como começou a jornada científica que o levou a essa descoberta.

“Foi uma descoberta casual. Eu sobrevoava Rio Branco, no Acre, quando vi da janela do avião um desenho enorme de sol. Aquilo não era natural. Depois voltei em um avião menor, fotografei e filmei. E a partir dali, os geoglifos passaram a fazer parte da história da Amazônia. Isso já tem mais de 20 anos.”

Ranzi destacou que o desafio, agora, é aproximar o público desse conhecimento e valorizar o patrimônio arqueológico amazônico.

“Nos nossos livros aparecem as pirâmides do Egito e as Linhas de Nazca, mas pouco se fala dos nossos monumentos, que estão aqui, no coração da Amazônia. A exposição Desvelando o Passado Profundo foi pensada exatamente para isso — para que as pessoas saibam que esse patrimônio é nosso e que precisamos conhecê-lo, protegê-lo e transformá-lo em base para educação, pesquisa e turismo sustentável.”

A exposição no MUSA reúne 23 painéis com imagens aéreas, mapas e textos explicativos que ajudam o visitante a compreender a dimensão e o significado dessas estruturas. O espaço foi pensado para ser um ponto de encontro entre ciência, cultura e memória, convidando o público a enxergar a floresta não apenas como natureza, mas também como história viva.

Com o olhar voltado para o céu e os pés fincados no chão da floresta, os pesquisadores do Instituto Geoglifos da Amazônia acreditam que o estudo dessas estruturas é uma oportunidade de recontar a história da Amazônia sob a perspectiva de quem sempre a habitou.

“É a chance de mostrar ao mundo que a floresta não é o vazio que se pensava. Sob o verde da mata, há uma civilização inteira esperando para ser compreendida”, conclui Hudson Ferreira.

 

 

 

Por João Paulo Oliveira, da redação da Jovem Pan News Manaus

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