A memória do naufrágio do Transrégia II volta a ganhar força com a segunda edição do livro Naufrágio no Amazonas, do desembargador Cezar Bandiera. A obra retoma um dos episódios mais marcantes da história da navegação na região, apresentando um relato pessoal e emocional de quem viveu a tragédia e transformou a experiência em reflexão profunda sobre a vulnerabilidade dos rios amazônicos.
No livro, Bandiera reconstrói a madrugada de 7 de maio de 1983, quando a embarcação afundou no rio Amazonas, deixando dezenas de mortos entre adultos e crianças e expondo fragilidades crônicas da infraestrutura fluvial. O acidente, segundo ele, permanece como um marco de negligência, improviso e falta de fiscalização, fatores que continuam presentes na rotina de quem depende dos rios como via de acesso.
Memória como forma de denunciar e preservar
Ao revisitar o episódio quatro décadas depois, o autor oferece mais do que um relato autobiográfico. Ele se propõe a reconstituir a memória coletiva do acidente, buscando registros esquecidos e documentos quase inexistentes. Para esta edição, Bandiera percorreu arquivos, consultou jornais do Pará e de Itacoatiara e reuniu pistas que ajudam a reconstruir o cenário que antecedeu a tragédia.
Durante participação no programa Minuto a Minuto, da Jovem Pan News Manaus, ele destacou o peso emocional de retornar a esse capítulo da vida.
O tema do livro decorre do fato de eu ter sido juiz na comarca de Parintins, nos idos da década de 1980. Eu era juiz dessa comarca, mas eu tinha que ir retornar. E o retorno se dava sempre pelo voo da TAPA. Eu desci da rede, que tinha uns camarotes. Tinha até o timoneiro ali, o comandante. Quando eu voltei para a rede, eu vi que passou uma pessoa rápido, que eu acho que era o comandante. Eles falaram lá e reduziram. Reduziram para marcha lenta. Depois aceleraram novamente e reduziram. O drama que essas pessoas viveram, pessoas anônimas, outras de relevo na sociedade, como era o caso do pai e da mãe do Dodó Carvalho, que estava no barco.
Bandiera afirmou que o silêncio que guardou por tantos anos não veio por esquecimento, mas pela dificuldade de reviver cada detalhe da noite em que lutou para sobreviver e ajudar outros passageiros. Ele explica que escrever o livro foi uma maneira de honrar as vítimas e reforçar a necessidade de políticas mais firmes para evitar novas tragédias.
Eu comecei a escrever, escrevia e tal, a máquina quebrava, o computador apagava, eu chorava. Por exemplo, hoje eu falo, assim, normal. Assumo que você é jovem de boa, mas de boa antes era complicado. Eu escrevi o livro, enfim, depois de décadas. Porque ele é um repórter da história do nosso Amazonas. Ele representa, mais ou menos, ele traduz, através das minhas palavras, das minhas vivências, o drama que essas pessoas viveram.
Fragilidades que atravessam décadas
A coordenadora editorial da Valer, a doutora em Filosofia Neiza Teixeira, ressalta que a narrativa evidencia problemas estruturais que ainda marcam o transporte fluvial na Amazônia. Para ela, a obra revela um sistema que negligencia vidas e perpetua vulnerabilidades que poderiam ser evitadas.
Em sua análise, Teixeira também observa que, apesar dos avanços na construção naval e na tecnologia das embarcações, as falhas administrativas, a ausência de fiscalização adequada e o abandono das comunidades ribeirinhas seguem como grandes desafios.
Um retrato da Amazônia que insiste em ser ouvido
Ao longo da obra, o autor trata não só do desespero vivido durante o naufrágio, mas também da força espiritual, da solidariedade e das decisões tomadas em segundos para salvar vidas. A narrativa mistura introspecção, denúncia e reflexão, criando um documento que resgata uma parte importante e dolorosa da história amazônica.
Bandiera reafirma que sua intenção não é apenas contar o que aconteceu, mas contribuir para que a tragédia não seja apagada da memória coletiva. Ele destaca que a falta de registros oficiais e a escassez de documentos sobre o naufrágio evidenciam o quanto essas histórias são esquecidas ou mal preservadas.
Lançamento da nova edição
A segunda edição de Naufrágio no Amazonas – o acidente do Transrégia II será lançada nesta quinta-feira, 27 de novembro de 2025, às 18h30, no salão de eventos da Valer Teatro, no Largo São Sebastião. A entrada é gratuita.
Fonte: Com informações da Assessoria de Imprensa
Por Ismael Oliveira – Redação Jovem Pan News Manaus






