Exclusiva: Denúncias de fraudes em aplicativos de entrega crescem em Manaus e acendem alerta sobre segurança digital

Casos de consumidores que alegam desvios de pedidos e cobranças indevidas expõem falhas na comunicação e logística das plataformas, segundo apuração da Jovem Pan News Manaus.

Manaus enfrenta um crescimento preocupante de denúncias relacionadas a desvios e furtos em entregas feitas por aplicativos. 

Vários casos foram relatados à Jovem Pan News Manaus, que apurou cada um deles.

Iniciamos com Júlia, 23 anos, estudante de marketing. No último final de semana, ela fez uma solicitação de encomenda pelo aplicativo motor Uber. Segundo ela, o motorista  recolheu a encomenda (contendo perfumes e acessórios) no bairro Educandos, mas finalizou a viagem antes de chegar ao destino (bairro Santa Luzia), depois ele sumiu com o pacote. 

A plataforma foi acionada imediatamente, mas não houve solução até o momento. Júlia registrou o Boletim de Ocorrência, on-line, e disse que a Polícia Civil entrou em contato com o proprietário da motocicleta usada na entrega. E no relato dele à PC foi confirmado que quem havia feito a corrida era outra pessoa, que já usava os seus dados e a moto com seu consentimento. O proprietário informou ainda que o condutor suspeito do furto, já era conhecido por praticar esse tipo de golpe, utilizando o seu veículo para se passar por entregador.

 

“A moto não é de quem estava fazendo a corrida, é de outra pessoa. A polícia entrou em contato com o dono da moto e ele contou que o rapaz é acostumado a fazer isso, a ficar com as encomendas. Quando fomos verificar, a foto do perfil na Uber também não era dele, era de outra pessoa”, frisou Júlia.

O desfecho da história da estudante foi diferente de outros casos parecidos. Ela conseguiu reaver as suas compras após o registro de B.O.

Relatos de Golpes em Aplicativos de Corrida

Assim como Júlia, outros usuários têm compartilhado experiências preocupantes relacionadas ao uso dos aplicativos de corrida, especialmente envolvendo a finalização incorreta das corridas solicitadas. Um problema frequente ocorre quando motoristas não concluem as viagens no sistema, o que acaba gerando débitos indevidos para os usuários em viagens futuras.

Angela Maria, 61 anos, auxiliar de serviços gerais, conta que costuma escolher o pagamento em dinheiro, pois não se sente confortável em deixar as corridas pagas antecipadamente no app. “Isso já aconteceu diversas vezes comigo, tanto na Uber quanto na 99. Eu confio no motorista, acreditando que ele iria finalizar a corrida corretamente, mas não foi o que aconteceu”, relata.

Além disso, Ângela destaca que essa situação já afetou seu filho de forma ainda mais grave. “Meu filho costumava pedir Uber para mim, e depois disso tudo aconteceu. Além dos problemas com as corridas que não eram finalizadas, o cartão dele foi clonado, e ele teve que bloquear o cartão para evitar prejuízos maiores”, explica.

Outros usuários relatam casos semelhantes, inclusive em serviços diferentes, ainda na plataforma da Uber e da  99 de entrega. Laura Rachor compartilhou sua experiência e disse que foi “frustrante”: “Pedi um Uber para entregar uma marmita no trabalho do meu marido, sumiram até com o meu pote. O motorista retirou a encomenda na minha casa, mas desapareceu com a entrega, almoço e ainda marcou o serviço como concluído no aplicativo.” 

As vítimas desses golpes afirmam que, mesmo após denunciar as ocorrências diretamente aos aplicativos, as respostas sempre são escassas ou insuficientes. Muitas vezes, são informadas de que a plataforma não pode intervir, deixando os usuários sem soluções e com prejuízos financeiros.

Abusos relatados e situação da categoria em Manaus

Para o presidente da associação dos motoristas de aplicativo de duas e quatro rodas em Manaus, Alexandre Matias, o crescimento dos casos de desvios reflete falhas de cadastro, ausência de seguro para cargas de menor valor e falta de mecanismos de responsabilização das plataformas. Ele foi o primeiro motorista por aplicativo da Uber em Manaus e alerta que muitos entregadores “sabem que a empresa não vai fazer nada”, quando o cliente é assaltado ou de que o motorista é acusado de não entregar o produto. 

Outro dado fornecido por ele são os desvios de rota e furtos, somente nas plataformas de transporte ou entrega rápida são registrados em média de 3 a 4 casos por semana em que o motorista finaliza a corrida ou coleta da encomenda, mas não realiza a entrega e desaparece com os produtos.

Entre os relatos de crimes mais comuns no transporte de encomendas por aplicativos estão: “Finalização da viagem no app sem realizar a entrega da encomenda; Motoristas que reclamam que os valores abaixo de R$ 5.000 não têm cobertura de seguro pela empresa; Plataformas que exigem metas de entregas e penalizam motoristas por reclamações, mesmo sem investigação”, é o que afirma Alexandre.

Black Friday e final de ano ampliam risco de fraudes

Especialistas alertam que o volume de compras online e entregas cresce significativamente durante eventos como a Black Friday e o período de fim de ano, elevando a exposição de consumidores e entregadores a práticas ilícitas. O aumento das remessas e da demanda por apps e-commerce tornam-se um gatilho para algumas fraudes e desvios, segundo quem trabalha neste segmento na capital amazonense.

A Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm) estima que o e-commerce nacional deve movimentar R$ 224,7 bilhões em 2025, um aumento de 10% em relação a 2024, o que amplia também a atuação de golpistas digitais. Já o Banco Central registrou um crescimento de 120,7% nas transações via Pix durante a última Black Friday, movimentando R$ 130 bilhões em um único dia, o que aumenta o risco de fraudes devido à instantaneidade das operações.

Segundo a Visa, houve um aumento de 85% nas tentativas de fraude bloqueadas globalmente em 2024, evitando cerca de US$ 40 bilhões em perdas — resultado de investimentos em inteligência artificial e análise comportamental em tempo real.

O cenário acende um alerta para consumidores sobre a importância de redobrar cuidados ao realizar compras ou entregas em ambiente digital, verificar a procedência de mensagens e aplicativos, e evitar transações fora das plataformas oficiais.

Direitos em destaque ao consumidor

Para o consumidor em geral, o principal amparo legal é o Código de Defesa do Consumidor (CDC), que tipifica as plataformas como responsáveis solidárias pelos serviços prestados e inclusive entregas. Isso significa que, em caso de furto ou desvio da encomenda, o consumidor pode exigir ressarcimento ou troca do produto.

Para os entregadores, a legislação estadual também está em vigor. A Lei Estadual nº 7.473/2025 do Amazonas obriga que empresas de transporte particular por app informem à autoridade policial eventuais denúncias contra motoristas por crimes contra a dignidade sexual. 

No âmbito municipal, o único Projeto de Lei sobre o tema é o PL nº 033/2022 do vereador Raiff Matos que criou pontos de apoio para trabalhadores de apps, incluindo entregadores porém, segundo os motoristas, muitas dessas medidas ainda não foram implementadas efetivamente.

Em casos de suspeita de golpe, é recomendado registrar boletim de ocorrência, reunir comprovantes de pagamento e entrar em contato com o Procon-AM pelo telefone 0800 092 1512 para formalizar a denúncia.

Desdobramentos e outras denúncias: Número crescente em atrasos de compras on-line

Nos últimos anos, as compras pela internet se tornaram parte essencial da rotina dos brasileiros, que buscam praticidade, variedade de produtos e melhores preços. No entanto, junto com o aumento das vendas digitais, também crescem os relatos de consumidores que enfrentam atrasos, cancelamentos e produtos não entregues por grandes plataformas de e-commerce e seus representas de entregas locais.

Segundo dados da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), o comércio eletrônico está entre os setores que mais recebem reclamações no país, especialmente relacionadas à entrega fora do prazo e à dificuldade de contato com os vendedores. Em muitos casos, o comprador fica sem o produto e enfrenta longos processos para reaver o dinheiro.

Um dos consumidores afetados é o comunicador Haliandro Furtado, que compartilhou sua experiência após comprar um celular pelo aplicativo de uma dessas grandes lojas  de rede varejista especializada na venda de eletrodomésticos, eletrônicos e móveis. O aparelho, segundo ele, seria utilizado em uma viagem e também como ferramenta de trabalho.

“Comprei o celular no dia 26 de setembro, com previsão de chegada para o dia 1º de outubro. Já se passaram duas previsões de entrega, e depois disso nada mais foi informado. Até hoje, sigo sem uma perspectiva de quando o aparelho chegará”, relata Haliandro.

O atraso da entrega trouxe transtornos financeiros para Haliandro, além de comprometer a programação da viagem. O aparelho adquirido tinha função direta no trabalho dele, que pretendia utilizar o celular para registrar fotos e conteúdos profissionais. As parcelas da compra também começaram a ser cobradas no cartão de crédito, aumentando a frustração diante da falta de resposta da empresa.

“Não é apenas um produto que não chegou, é uma ferramenta que faz parte do meu dia a dia e do meu trabalho. A expectativa criada na hora da compra acabou se transformando em frustração”, explica Haliandro.

Ele também ressalta a dificuldade de comunicação com a plataforma de compras.

“Tentei entrar em contato pelo aplicativo e pelos canais de atendimento, mas não obtive respostas concretas. É angustiante não saber se o produto vai chegar ou se vou precisar abrir um processo para receber o dinheiro de volta.”

Casos como esse têm se tornado cada vez mais comuns entre consumidores de grandes plataformas de aplicativos de passageiros e de e-commerce, revelando falhas na logística e na comunicação das empresas. A reportagem tentou contato com todos os aplicativos mencionados, mas até o fechamento desta matéria não conseguiu localizar um canal oficial de atendimento para solicitar esclarecimentos sobre os casos relatados.

 

Reportagem Erike Ortteip, Haliandro Furtado e Tatiana Sobreira, da redação da Joven Pam News Manaus

Arte Laura Ranchor

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